9.5.11

O Serial Killer que não desistiu a tempo

Após o penúltimo assassinato eu fiquei naquela zona de conforto pós-sangue. Ah! Como foi bom fazer aqueles cortezinhos cirúrgicos! Mas minha última vítima foi complicada.
Eu vinha observando ela por um bom tempo. Ia anotando seus passos e sua rotina.
Eu sempre alternava meu disfarce para não chamar a atenção da moça. Jamais conseguiria ser um assassino se fosse bonito. Mulheres morenas e altas – minhas preferidas – jamais olhariam para um cara barbudo e de óculos em um bar, por exemplo.
Eu sabia todos os lugares que frequentava, que horas acordava, que horas almoçava, que horas ia aos pés. Sabia bem os banheiros que ela preferia para fumar escondida nos restaurantes. Um dia acordei e pensei: chega não agüento mais de saudade daquele sanguinho quentinho saindo de uma bela morena. Dei aquela chicotadinha nas minhas costas e bolei o plano. Depois disso a minha vida começou a virar um inferno.

Na noite em que resolvi matar Lorena eu já saquei que algo estava estranho. Ela entrou no bar pra comprar cigarro, me olhou e sorriu. Ela NUNCA tinha feito isso. Pensei que meu disfarce estava funcionando. Mas tudo bem, fingi que não vi e não retribuí. A ideia era a seguinte: eu ia seguir ela até a rua XVII. Quando ela dobrasse a direita eu seguiria reto e pegaria a moto para fazer a volta na quadra mais rápido que ela. Na passagem do beco, eu ia ensacar a cabeça dela e jogar dentro da van.
Incrivelmente, ela saiu do bar e tinha muita gente na calçada. E percebi um homem do outro lado da rua – que depois fui apresentado como Bruno – falando num celular e olhando pra ela. Logo vi que ela atendeu e olhou pra ele. Cruzou a rua e os dois foram juntos até o teatro. (Sabia que deveria ter grampeado o telefone dela.. acho que ela está começando a namorar).

Bom, tudo bem. Tentarei amanhã ou depois. Mas vou mudar a estratégia.

Quinta à noite ela sempre ia ao mercado. Mudei o disfarce. Coloquei um terno e a segui até a loja. Comprei um Ruffles e um capuccino e fiquei comendo no carro até ela chegar ao caixa. Ia oferecer ajuda para colocar a compras no porta-malas e tentar marcar um encontro. Eu tava muito bonito pra ela recusar um café. Me distraí e quando percebi, ela já estava chegando perto do carro. Levantei correndo e não me dei conta que tinha colocado o cinto de segurança. Resultado: mancha na camisa. Assim não dá! E ainda por cima vi que o namoradinho dela estava no carro. Ele me viu limpando a camisa com o lenço de papel. Eu batia a cabeça no volante de raiva e ainda por cima bati a cabeça na buzina quando o carro dela passava ao lado do meu! Ela também me viu. Menos um disfarce, mais um plano para elaborar.

Bom, tudo bem. Tentarei amanhã ou depois. Mas como?

Na sexta ela sempre vai naquela boate chinfrim na rua 51. Boa noite Cinderela na moça!
Ela sempre toma aquele drink verde de menta, vodka e tônica. Barbada. Vou distrair ela e colocar o pó na taça. Perfeito. Depois eu sento com ela e a levo pro meu lugar preferido: o sótão da minha casa. Onde eu corto aquelas pernas e braços lindos e morenos e monto as perucas dos meus disfarces. Mas o universo realmente estava conspirando contra mim. Era muito azar.
Ela chegou, pediu o drink e assim que chegou eu sentei ao seu lado. Pedi o mesmo que ela e coloquei a droga. Puxei papo e troquei as taças sem ela perceber. Ela sorriu e conversou comigo um pouco. Quando ela estava levando a taça a boca um bêbado começou a bater com a cadeira no garçom que esbarrou nela e a bebida foi toda, todinha pro chão. E eu não tinha droga reserva. Imagina a minha raiva. Eu juro que chorei de raiva. Eu não agüentava mais. A minha crise de abstinência estava me matando. Eu sonhava com um mundo vermelho, com pernas e braços andando pelas ruas e gritando meu nome. Era pesadelo atrás de pesadelo.

Bom, tudo bem. Tentarei amanhã. Mas agora ela pode me reconhecer. O que fazer, por final?!

Já sei! Agora vai!

Restaurante e banheiro. Cigarro e morte. Eu sou um gênio! Como não pensei nosso antes!

Sábado é o dia que ela janta com as amigas. Sem falta. Vou pegar ela no banheiro e tirar pela janela dos fundos. É barbada e no sábado a noite não tem carga e descarga atrás do lugar. Não pode fumar e eu SEI que ela toma uns goles e fica a fim de fumar, vai ao banheiro e fuma. Eu sei. E já segui ela até a porta do banheiro.
Cheguei antes, pedi um yakisoba e uma jarra de vinho barato. Ela chegou junto com duas meninas loiras e sentaram na mesa de sempre. Cerveja vai, cerveja vem. Porções de camarão e batata frita. Aqueles gritos e risadas que só as meninas sabem fazer ecoar dentro de um lugar fechado. E nada de ela ir ao banheiro. Já estava ficando tonto com aquele vinho maldito. Minha impaciência já estava me esmurrando a cara.
Mas finalmente ele levantou e desfilou em direção a morte.

Contei até 10. Eu tremia de excitação e alegria. O choro que era de raiva quase saiu em forma de alegria. Era hoje o dia! Levantei e fui em direção a ela. Rolou aquele encontro no corredor de entrada dos banheiros em que os dois desviam pro mesmo lado, sabe?
Eu senti o perfume doce que vinha dos cabelos negros e longos.
Esperei ela entrar no banheiro. Contei um minuto e meio e entrei atrás dela. Não senti cheiro de cigarro. E ouvia só um barulho de água escorrendo. Começou o meu desespero e minha mão esquerda começou a tremer. Quando dobrei para a parte em que ficam as pias e vi aquela morena estirada no chão, segurando um cigarro, imóvel e com a cabeça toda ensangüentada. Ali eu ajoelhei, chorei e gritei de raiva até que uma garçonete entrou para ver a cena. Eu gritando desesperadamente e batendo com a cabeça na parede: a pia! Perdi para uma pia! Uma pia!

*dedicado a Carolina Carvalho que me indicou o seriado Dexter

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